Pedi aos meus alunos ...


Pedi aos meus alunos que fizessem uma redação, não delimitei o assunto, mas sugeri que utilizasse o coração para expressar o que estavam sentindo. 
Muitos falaram sobre o medo de conviver num bairro perigoso, outros falaram sobre a situação familiar e outras preocupações de cunho econômico. 
A medida que lia conseguia vislumbrar a justificativa de muitos comportamentos em sala de aula, por exemplo, consegui entender porque uma determinada aluna faltava tanto. A justificativa era simples, ela compartilhava o sapato com outras duas irmãs, logo quando uma ia a escola as outras duas ficavam em casa, pois não podiam comparecer sem o uniforme completo ( aqui em Salvador utilizamos o termo "fardamento").
Outro caso que me tocou foi de um menino que durante as aulas sempre dizia que queria ser presidente, não tinha outra profissão para ele, a questão era ser presidente do país e ponto final. Lendo a sua redação percebi que ele vivia em quase abandono emocional. A mãe separou do pai e foi para São Paulo e lá constituiu nova família ele ficou morando com o pai e a avó. O pai trabalhava em dois empregos para poder sustentar a família. Em sua escrita o menino dizia:

 " Eu quero ser presidente para acabar com esse história de família despedaçada, porque a criança sofre muito. Eu quero ser presidente pra minha mãe ter orgulho de mim. Aí eu ia aparecer na TV e ela iria dizer que me amava. Eu quero ser presidente pra minha avó poder se tratar com médicos bons, assim ela não fica o tempo inteiro acordando de madrugada para pegar fila pra tentar ser atendida. Eu quero ser presidente pro meu pai não ter que se matar de trabalhar pra pagar o aluguel e botar comida na mesa. Eu quero ser presidente pra que toda criança ganhe presente no dia das crianças e principalmente no Natal ( digo isso, pois não acredito no papai Noel, já escrevi um milhão de carta ele nunca levou o vídeo game e o panetone lá em casa. Por isso eu sei que ele não existe!). Então de verdade, eu quero ser presidente porque eu quero fazer a gente feliz."


Esse história é verossimilhante , pois são remanescência das minhas memórias afetivas provenientes da minha experiência estágio num Colégio Municipal , na periferia da cidade de Salvador. Ao escrever esse texto todo o ano que estive com essas crianças vieram à tona. Saudades dos meus meninos.

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